A Constituição Federal, em seu artigo 38, diversamente de outros cargos eletivos, não impede, como regra, que os vereadores exerçam, concomitantemente, sua profissão. Veda, apenas, a acumulação da vereança com o cargo público, mas exclusivamente quando haja incompatibilidade de horários (algo raro nos municípios menores). Logo, o ocupante do cargo de vereador não deve depender dos subsídios na Câmara para manter sua vida independente.
Dados do IBGE revelam que o Brasil tem aproximadamente 5,5 mil municípios, praticamente 90% deles com população inferior a 50 mil habitantes. Levando-se em consideração que cada Câmara desses municípios menores (geralmente os de menor orçamento) tem entre nove a 13 vereadores, fácil concluir a economia de recursos com a extinção dos subsídios. Certamente, bem administrados, esses valores poderão ser vertidos em favor da saúde, obras públicas, projetos sociais etc., ou do próprio propósito fiscalizador das Câmaras Municipais.
A análise da situação não pode deixar de ser contextualizada com o que se passa em outras democracias. Na Europa, países com renda per capita três vezes superiores à nacional e que desfrutam de níveis de desenvolvimento social ainda sonhados por aqui, entendem que o trabalho voluntário e o esforço pessoal de representantes municipais deve ser incentivado e utilizado como meio de formação de agentes políticos. Mais do que isso, entendem que o dinheiro obtido a duras penas do contribuinte deve ser destinado a atender, fundamentalmente, as necessidades imediatas da comunidade.
Na França, a função dos conseillers municipaux é historicamente gratuita, existindo apenas a possibilidade de reembolso de despesas, circunstância extremamente limitada por lei nos municípios com menos de 100 mil habitantes. Sistema muito similar é adotado no Reino Unido, com os chamados local councillors. Quando há remuneração, esta mais se aproxima dos salários mínimos vigentes e tem como objetivo remunerar o tempo especificamente gasto com o trato das questões municipais. Exemplo disso se encontra no sistema português, onde os vereadores de Lisboa e do Porto, em regime de não permanência, recebem pouco menos de EUR 80 por sessão, podendo este valor ser ainda reduzido em municípios menores.
Em nenhum desses países a função de vereador se mostra atrativa como um emprego, uma forma de renda. Mais importante que isso, a exigência de que a atividade pública seja conciliada com atividades particulares para a subsistência pessoal, especialmente nos municípios menores, não figura como impedimento à autonomia e à independência destes agentes políticos.
A questão, portanto, que se coloca é: como então no Brasil — principalmente nos municípios menores —, onde os recursos são escassos e as necessidades básicas do cidadão são amplas, podemos nos dar ao luxo de gastar tanto com vereadores?